Glória Perez: A mulher que mudou a lei brasileira

Atenção: Alerta de spoiler da série ‘Pacto Brutal: O assassinato de Daniella Peres’, da HBO Max.

Despretensiosamente, há alguns dias atrás, eu assisti o documentário “Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez”. E eu tive a necessidade de registrar aqui, em minhas cartas abertas, a admiração que senti pela mãe da Daniella, a escritora Glória Perez.

Já escrevi outros textos com o mesmo foco, e você pode saber mais sobre histórias inspiradoras como esta. A de Coco Chanel por exemplo, ou as “Las Mariposas”, que sendo sincera, são histórias de vida que me marcaram profundamente ao escrevê-las.

Então, quando assisti esse documentário eu entrei em “choque”, surpresa por diversos motivos, mas o que me despertou esse gatilho foi a força dessa mulher!

É impresisonante como Glória, conseguiu manter a garra e uma superioridade inimaginável nesse momento trágico de sua vida.

O que aconteceu no caso de Daniella?

Dani foi uma artista e bailarina brasileira, querida por todos e considerada a namoradinha do Brasil. Um fenômeno com seu jeito único, uma moça talentosa, jovem e cheia de planos pela frente. 

Daniella nasceu em 11 de agosto de 1970 no Rio de Janeiro efoi casada com o ator Raul Gazolla. Em dezembro /72 ela foi ssassinada de forma brutal e sinistra por duas mentes perigosas, Guilherme de Pádua e Paula Nogueira Thomaz.

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Daniella Perez e Raul Gazolla

Sinistra pela forma como tudo aquilo se parecia com um ritual bizarro. Dani foi morta com 18 punhaladas, principalmente ali na região do peito. Envolta por um circulo queimado, posicionada com os braços e pernas abertos para cima e haviam coisas estranhas, como um pedaço do cabelo cortado.

Na época, Glória estava dirigindo a novela “De Corpo e Alma”. E por mais que fosse um momento profundamente doloroso, ela decidiu continuar escrevendo, como uma forma de manter a própria sanidade.

Em suas declarações a imprensa, ela demonstrou um pouco da dor profunda que sentia. Glória estava sem chão e tinha perdido todos os referenciais. E foi justamente na novela, que ela encontrou um ponto de apoio e vínculo com a vida concreta.

Mas então porque ela quis entrar em uma batalha tão pesada e complicada com a justiça? 

Glória desabafou que ao chegar em casa, depois do enterro de sua filha, se deparou com a declaração do delegado na televisão. Ele dizia que aceitava a declaração do criminoso como verdadeira. Ela não aceitou! Isso a fez perceber que estavam assassinando sua filha pela segunda vez, só que dessa, era moralmente.

Nesse momento Glória tinha bem claro em sua mente o que tinha que fazer. Saber quem eram os assassinos da sua filha e por que o fizeram.

As autoridade aceitaram de início que apenas Guilherme havia matada Daniella, por motivos que não faziam sentido. Glória sabia que faltavam peças do quebra-cabeça, então ela começou a investigar.

Glória Perez foi de escritora a detetive

Em toda essa investigação ficou óbvio que havia sido um crime premeditado, inúmeras provas e testemunhas que foram quase impossíveis de entrar em contato. Como por exemplo os frentistas do posto de gasolina onde Daniella foi abordada por Guilherme, foram demitidos, um turno inteiro de frentistas demitidos. Eles sabiam de alguma coisa.

Nessa busca por justiça, as testemunhas batiam a porta na cara dela. Ela chegou até mesmo, a ficar horas na calçada das testemunhas, sentada no meio-fio em busca de uma mínima explicação. Por que elas não queriam falar? Estavam com medo? Com muito esforço Glória Perez provo que o assassinato foi planejado.

E mesmo assim, houve muitas complicações na tentativa de fazer justiça por Daniella Perez. Entre elas, algo que eu não fazia idéia e, inclusive achei um absurdo, foi saber que homicídio no Brasil, só era considerado um crime hediondo quando envolvia a questão patrimonial.

Glória fez uma comparação no programa do Jô Soares, quando foi entrevistada. Confira:

Entrevista de Glória Perez no programa do Jô Soares no SBT

Então quer dizer que, no Brasil pelo menos naquela época, tirar a vida de alguém não era considerado um crime hediondo! Mesmo que essa morte fosse premeditada, o que com certeza, pelo menos em minha opinião, é bem mais cruel do que um crime passional

Glória nesse mesmo epsódio relata sobre quando foi entrevistada por outros reportéres do mundo inteiro. Todos eles pensaram que ela estava contando uma história de ficção, porque em nenhum lugar do mundo há uma legislação assim. 

Mas afinal o que Glória Perez queria de fato? 

Através de uma legítima comoção nacional, embalada pela indignação de brasileiros dos quatro cantos do país, seu objetivo era mudar a constituição brasileira. Mais do que querer, ela fez! 

Glória Maria Rebelo Ferrante escritora, roteirista, produtora e autora brasileira, conseguiu mudar a lei! Não pensando apenas no seu própio caso, mas também em milhares de outras mães que infelizmente passaram por situações parecidas. Como Jocélia Brandão, mãe da pequena Miriam Brandão, que foi assassinada em Minas Gerais na mesma época que Daniella. Miriam foi sequetrada e incendiada viva pelo pastor Wellignton Gontijo.

A partir de então e até os dias de hoje, Jocélia tem se dedicado a assitencia social. E, ninguém vai esquecer de como ela e outras mães guerreiras lutaram para mudar a lei para homicídio qualificado.

Elas precisavam de 1 milhão de assinaturas para conseguir a aprovação do congresso. Vamos ressaltar que ainda não existia a internet e poucas pessoas tinha ascesso a um telefone, e por mais surreal que pareça elas conseguiram!

Com ajuda de amigos e a divulgação em programas de TV, elas consguiram juntar 1,3 milhôes de assinaturas do Brasil inteiro. Para que assim, o congresso escutasse o apelo a modificações imediatas na legislação, no que diz respeito a crimes hediondos’.

Nesse ponto é importante destacar que também se existia naquela época a lei da primariedade, então a pena era quase que um blefe.

Glória por sua vez explicou muito bem quando disse que não pode sair na rua e encontrar os assassinos da sua filha fazendo uma caminhada.

“Que pela Constituição, seja garantido e resguardado a cada brasileiro, o bem supremo do direito á vida e não agredido como tem sido pelas leis penais do país. A inquietação social exige uma resposta”.

Glória Perez mudou a lei brasileira

Então elas estavam ali, com caixas e mais caixas cheias de assinaturas, tentando convencer os senadores. Porém, nenhum deles parecia disposto a ouvir, eles levantavam e iam embora aos poucos, a esperança indo embora também.

Afinal aquele era o ultimo dia em que poderiam aprovar essa lei, o congresso iria entar em recesso no dia seguinte.

Felizmente a lei foi sancionada pelo presidente Itamar Franco, sem os vetos. No feriado de Sete de Setembro, o projeto foi aprovado pelo Congresso, o que redefiniu os crimes hediondos.

Projeto aprovado com mais 1,3 milhoes de assinaturas em 1994

Ficou provado que houve premeditação do crime. Assim o casal, Guilherme e Paula, foi acusado de homicídio qualificado por motivo torpe, com impossibilidade de defesa da vítima.

Guilherme de Pádua e Paula Thomaz foram condenados a dezenove anos de reclusão. Tendo Paula a pena reduzida em dezoito anos e seis meses de reclusão, pelo fato dela ter menos de 21 anos na data do crime.

E vejam só, após 7 anos de cumprimento da pena, Guilherme de Pádua e Paula Thomaz deixaram o cárcere. Sim, a Lei 8.930/94, que incluía o homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos foi aprovada. Entretanto é importante você saber que essa modificação não pôde interferir no cumprimento de pena da dupla. Sabe por quê? Porque a lei não pôde retroagir e colocar o réu em uma situação pior, do que a que ele se encontrava na época do fato.

Hoje Guilherme de Pádua se tornou pastor de igreja e Paula Thomaz advogada. No final a justiça não foi tão efetiva no caso de Daniella, mas com certeza foi um marco grandioso na história da humanidade.

Glória nos dias atuais pensa somente em nunca mais ter que cruzar o caminho dos dois assassinos de sua filha. É quase que palpável o sofrimento que ela carrega consigo por todos esses anos.

Uma frase dita uma vez por Glória que me fez ficar emotiva. Foi a que ela tem vocação para ser feliz, no entanto, jamais conseguiu alcançar a plenitude da felicidade após a perda brutal. Apesar disso continua seguindo em frente e fazendo o que ama fazer, escrevendo suas histórias deixando os noveleiros reflexivos.

Eu gostaria de finalizar dizendo o quanto eu aprecio o que você fez pelas pessoas desse país Glória. E como eu me senti tocada por sua história, você é uma mulher incrível, inspiração para mim. Gratidão!

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